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11 mar 2021 | Artigos
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Palavras-Chave: Direito Civil. Leilão extrajudicial. CDC. Código de Defesa do Consumidor. Leilão extrajudicial. Leilão judicial. Arrematação. Condicional. Aplicação. Garantia. Hasta pública. Bens Apreendidos. Financiamento. Sinistro. Fornecedor. Leiloeiro. Consumidor. Compra e venda. Laudo. Laudo cautelar. Laudo ECV.

Tendo em vista a massificação dos chamados leilões extrajudiciais, que massivamente promovem publicidade acerca de grandes oportunidades na arrematação de veículo, com valores de até 30% do valor de mercado, oportuno destacar alguns fenômenos de mercado, que, na maioria das vezes, não encontram respaldo no mundo jurídico.

Na maioria das vezes, os certames são organizados por empresas de diversos ramos, que buscam uma venda rápida e desburocratizada de seu ativo, sendo o certame conduzido por leiloeiros devidamente inscritos nas Juntas Comerciais do Estado.

A exemplo, financeiras direcionam à hasta pública bens móveis e imóveis recuperados de contratos de financiamento inadimplidos, ou mesmo parte de seu ativo que não possui uso prático, como carros de frota, materiais de escritório usados, maquinário, entre outros. Em tais ocasiões, são denominados, na hasta, como comitentes vendedores.

Ainda, seguradoras promovem a venda de veículos recuperados, os popularmente chamados de “sinistrados”, ou seja, veículos que forma objeto de ocorrência de sinistro.

Atualmente, os veículos objeto de sinistro são classificados em três níveis distintos, pequena, média e grande monta, podendo variar de um simples dano que não compromete a qualidade do veículo, até mesmo grandes colisões que tornem o veiculo subordinado a realização de laudo para ser novamente colocado em circulação.

Quando o veículo não possui condições de retornar ao uso, o mesmo é vendido como sucata, sendo que apenas as empresas de desmonte são autorizadas a concorrer para a compra da referida sucata.

Contudo, com as alterações trazidas pela legislação, surgiram as empresas de vistorias realizam a feitura de dois tipos de vistorias, as chamadas cautelares e o Laudo EVC.

O popularmente chamado Laudo ECV é exigido pelo DETRAN/SP para a transferência do veículo, sendo que este laudo serve exclusivamente para a identificação do veículo.

Tal possibilidade se deu por meio da Resolução CONATRAN 282/08, uma vez que as vistorias poderiam ser realizadas tanto pelo DETRAN (e suas respectivas Ciretran´s) ou pelas ECV´s que possuem atuação exclusivas em vistorias.

Os Departamentos Estaduais de Trânsito padecem de atualização em suas rotinas e procedimentos, por tudo isso é que o CONTRAN editou a Resolução 282/2008 permitindo que as vistorias possam ser realizadas também por empresas privadas. Não entanto, o processo instrumental e técnico realizado pelas ECV´s não substitui a palavra final que é continua sendo dada pelo Estado através da aceitação ou reprovação dos laudos de transferência no SISCSV.

A Portaria 1334/2010 do DENATRAN não só criou a obrigatoriedade das ECV´s e dos DETRAN´s estarem interligados no mesmo sistema SISCSV, mas utiliza as novas tecnologias de segurança, dentre elas de OCR, Biometria, e Filmagem, como instrumento de fiscalização para inibição de fraudes e consequente preservação da vida e segurança do cidadão.

Anteriormente, as vistorias para transferência de propriedade eram realizadas apenas pelo Departamento Estadual de Trânsito (DETRAN). Quando era necessário realizar esse procedimento, as pessoas precisavam comparecer à respectiva sede estadual e dar entrada na documentação, para que o veículo passasse pela avaliação do órgão.

Contudo, caso o interessado pretenda avaliar o veículo de forma mais acurada, existe a contratação para a realização de laudo cautelar. Este tipo de vistoria se trata de exame aprofundado no veículo, no que tange seu estado geral de conservação e análise de possíveis indícios de fraude me numeração de chassis, motor e câmbio.

A vistoria cautelar veicular consiste na análise da originalidade dos pontos de identificação dos veículos (chassi, motor, câmbio, vidros, etiquetas de identificação, placas, entre outros), além de verificar se existem reparos estruturais significativos nas longarinas dianteiras e traseiras, painel dash, painel dianteiro, painel traseiro, laterais, teto e demais peças.

Após esta análise é emitido um laudo técnico contendo as descrições dos pontos analisados com as respectivas ilustrações fotográficas.

Complementando o laudo, a pesquisa realizada é anexada junto aos bancos de dados contendo informações oficiais do veículo, além de levantamento de leilões e informações de histórico de sinistro.

Conforme podemos notar, o laudo cautelar apresenta três fases distintas.

Muito embora o veículo possa apresentar aprovação pelas suas condições gerais por não apresentar qualquer anomalia estrutural, indícios de danos ou adulteração ou qualquer outra mácula que comprometesse o veículo em questão, pode existir o registro de leilão, tanto de recuperado de financeira, como de objeto de sinistro.

Dado tal mudança na dinâmica de compra e venda de veículos, surgiu o mito de que veículos comprados através de leilão sempre são “defeituosos” e por isso sofrem com a desvalorização no preço de mercado.

Tal assertiva é um mito, sendo reflexo da ignorância acerca do tema.

Primeiramente, cabe frisar que o popularmente chamado de veículo “sinistrado” é aquele que sofreu avaria de qualquer natureza ou mesmo que tenha sido objeto de roubo/furto ou qualquer outro tipo penal, bem este segurado por alguma empresa do ramo, que venha a indenizar o segurado pelo evento danoso.

Tal característica fica registrada no histórico do veículo, inclusive, gravado em seu documento de transferência (DUT) como no porte obrigatório.

Em tais casos, é compreensivo que o veículo sofra depreciação, posto que o mesmo sofreu danos que podem, em algum momento, gerar prejuízos ao atual proprietário.

Outro fato se dá pelas companhias de seguro não procederem com a contratação de seus serviços, ou mesmo estipularem um percentual reduzido de indenização em caso de futuro sinistro.

Contudo, o veículo recuperado de financiamento, na maioria das vezes, não possui qualquer dano derivado de colisão, enchente ou registro de roubo ou furto, ou seja, sem qualquer avaria indenizada, assim, o consumidor que adquire um veículo financiado com cláusula de alienação fiduciária, ao não honrar com as parcelas pactuadas, sofre a constrição do bem, mediante ação de busca e apreensão, ou mesmo entrega o veículo voluntariamente para realização de acordo.

Neste interim, a financeira contrata um leiloeiro oficial, para realizar o certame aos interessados, para que adquiram o veículo através de oferta de lances.

Assim, o veículo não possui avarias ou sinistros, somente se trata de um veículo que fora comprado através de financiamento, onde o comprador não honrou com o pagamento de valores relativo ao contrato firmado, posteriormente o bem fora recuperado pela financeira, que procedeu com leilão extrajudicial, para recuperar parte se seu ativo.

Oportuno lembrar que normalmente, toda revenda efetua o pagamento, em média, de 20 a 30% a menos que a tabela FIPE, uma vez que revende o veículo a outros consumidores, em média, pelo valor de mercado.

Com efeito, a própria Lei Consumerista atribui ao Fornecedor de produto defeituoso a possibilidade de reparação daqueles problemas dantes constatados, no prazo de 30 (trinta) dias; sendo que, apenas em caso de descumprimento deste prazo, é possibilitado ao Consumidor optar pela rescisão contratual, nos termos do artigo 18 do citado Diploma Legal, onde se lê:

“Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com as indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.

  • 1° Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:

I – a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso;

II – a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;

III – o abatimento proporcional do preço”.

Neste contexto, o bem recuperado, em regra, não apresenta defeito estrutural ou vício de qualidade além do que naturalmente previsto dado o ano de fabricação, quilômetros rodados e demais estigmas de uso, não gerando assim qualquer depreciação presumida por ter sido alienado em leilão.

Oportuno citar a jurisprudência formada a respeito de tal assunto, em processo, inclusive, subscrito por este autor, na qualidade de Advogado:

“RESPONSABILIDADECIVIL.AÇÃODERESCISÃOCONTRATUAL C. C. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAL E MATERAL. Compra e venda, mediante financiamento bancário, de veículo usado que havia sido objeto de leilão extrajudicial. Não comprovação da existência de vício a ensejar a diminuição do preço do bem. A simples origem, consistente em arrematação em leilão, não impõe, por si só, menos valia ao automóvel. Causa de pedir que não pode ser acolhida. Recurso desprovido.”

(…)

“Pois bem. Cumpre pontuar que o mero fatode o automóvel ter sido comprado em leilão, mais de um ano antes de ser vendido ao consumidor, não é suficientepara presumir a existência de avarias no bem, nem sua desvalorização.Com efeito, o autor não demonstrou ter suportado qualquer prejuízo, inclusive porque, ao que consta, consultou somente uma seguradora, o que não comprova a impossibilidade de contratação de seguro com cobertura integral para o automóvel em questão.”

(Apelaçãonº 1053924-07.2017.8.26.0100 – TJSP – 28ª Câmara de Direito Privado – Relator Des. DIMAS RUBENS FONSECA – DOE 13/02/2019)

E mais:

“EMENTA: Bem móvel – Veículo adquirido pelo autor junto a ré proveniente de leilão – Desconhecimento do fato – Ausência de comprovação da desvalorização do bem – Improvimento do recurso”

(SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. 26ª Câmara de Direito Privado. Apelaçãonº 1000424-74.2018.8.26.0590. Rel. Des. Vianna Cotrim. J. 1º/08/2018)

Contudo, resta a necessidade de prestar as informações devidas em caso de transação, principalmente se configurar relação de consumo, sendo imperiosa a disponibilização das informações do leilão por parte do revendedor.

Autor

Thiago Nogueira de Lima

Sócio fundador, advogado Consultivo e Contencioso atuante há mais de 15 anos nas áreas de Direito Civil e Empresarial.

Atua também como professor de graduação e cursos preparatórios para concursos há mais de 10 anos nas matérias de Direito Processual Civil, Direito Administrativo, Direito Empresarial e Consumidor.

Graduado com especialização em Direito Processual Civil.

Data
11 mar 2021
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Artigos
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